Rui Remígio – Parte 7 de 7

            

Rui Remígio

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Rui Remígio nasceu em 1945 no Funchal, foi Supervisor de Áudio na Emissora Nacional (EN), na RádioDifusão Portuguesa (RDP) e Técnico de Som nos Estúdios Musicorde Lda.

Entrevistado por Filipa Subtil e Francisco Sena Santos. Registado e editado por Paulo Barbosa – Gravado a 14-12-2018 na Biblioteca/ Espaço Cultural Cinema Europa.

    

RR p7 de 7 aos 0M8S- RR: A minha atividade, a nível político, tinha a ver com as emissões. Com os partidos políticos e as campanhas eleitorais. Ou então, no estúdio, a gravação de vários hinos associados a partidos políticos. FS: Para fechar, como é que viu e analisa o processo de reestruturação do operador público?
RR p7 de 7 aos 0M37S- A RDP fundir-se com o operador público de televisão? Como é que viu esse processo todo, qual é a sua leitura? RR: A rádio e a televisão existem no mesmo plano. Eu tenho que ser sincero: já o escrevi, já o disse, e mantenho: foi um erro enorme terem feito ou criado uma empresa em que juntaram a rádio e a televisão.
RR p7 de 7 aos 1M7S- Há várias maneiras de fazer a leitura: uma, na altura, o grupo RDP tinha lucros – pela primeira vez, já distribuía lucros pelos seus funcionários, era assim; nessa altura, já não estava lá, nunca recebi lucros, mas sei que foi assim; eu saí em 1995 – e, portanto, havia ali um grande património, havia ali dinheiro, havia know-how, havia um arquivo que era único no mundo – repito, no mundo – e, portanto, muitos carros, muitos
RR p7 de 7 aos 1M45S- microfones, muita coisa e, se calhar, há aqui uma coisa chamada cobertura digital do país que podemos matar à nascença, que está quase a terminar: que foi o grande sonho do senhor, do grande técnico e administrador, o homem da Página 1, diretor de programas, José Manuel Nunes. Porque o DAB – Digital Audio Broadcast – estava quase todo, pelo país todo.
RR p7 de 7 aos 2M15S- Estou à vontade porque, num regresso da Madeira ou dos Açores para… foi na vez em que eu fui à Madeira falar sobre música e tecnologias. O meu companheiro de voo foi o engenheiro Crespo da Renascença. E eu tinha ido, a convite do Oliveira Pires, fazer várias ações de formação no Grupo Rádio Renascença.
RR p7 de 7 aos 2M37S- E eu nunca tinha entabulado conversa com um homem marcadamente responsável pelo crescimento da Renascença e vem o engenheiro Crespo comigo ao lado. “Então, ó Remígio, já vi, gostei, tudo bem?” e tal. Fizemos ali as cortesias de parte a parte, claro, eu não me comparo sequer ao trabalho
RR p7 de 7 aos 2M58S- feito por ele. Mas foi agradável ouvir o que ele disse e, depois, falámos. O José Manuel Nunes, o DAB, que era o sistema que faria a cobertura de todo o país que hoje teríamos as rádios mais modernas de todo o mundo, não é cá mais nada. E foi por água abaixo, esse projeto.
RR p7 de 7 aos 3M22S- Foram muitos, muitos e muitos milhões. Milhões, não é milhares, por água abaixo. E ele não merecia isso – nós, rádio – nós, as pessoas que trabalhávamos na rádio – porque era um projeto único e o engenheiro Crespo a meu lado, viajámos juntos até Lisboa. Disse “De facto, não é megalómano, é um sonho que está quase pronto”.
RR p7 de 7 aos 3M48S- Isto em 1997. Eu já não estava na rádio, portanto, estava à vontade para manifestar a minha opinião. O que é que acontece: acontece que o engenheiro Crespo diz: “Rui Remígio, eu acredito”. Eu não sei se ele vai levar adiante, mas acredito que é um sonho que merece ser concretizado. Se não, é um pesadelo.
RR p7 de 7 aos 4M14S- Qualquer um de nós, quando acorda de um pesadelo, o que tem é más imagens, más recordações. Ao passo que o sonho era o DAB, cobertura técnica de todo o país e nós, no nosso rádio, tínhamos toda a informação de tudo o que estava a ser programado. Não é da mesma maneira que hoje, se forem programas que estão já previamente gravados, não temos lá informação nenhuma.
RR p7 de 7 aos 4M37S- Ao passo que o DAB teria. RR: Esta é a minha opinião: depois, é assim, o importante no sistema atual é o boneco, é a televisão. E o que é que está a acontecer: a televisão está a perder clientela. As novas gerações.
RR p7 de 7 aos 4M56S- É o computador, são as redes sociais. E, portanto, os microfones, os carros, o dinheiro desapareceu. E a Renascença, entretanto, saiu do Chiado da Rua Ivens – e foi ali para um sítio que, por acaso, eu conheço, tenho lá alunos meus a estagiar do último ano da EPI [Escola Profissional de Imagem] e tenho lá dois grandes amigos – tinha três, agora são só dois
RR p7 de 7 aos 5M26S- o José Manuel Piçarra e o Rui Fernandes. Um vem do curso da TSF e o outro integrou as ações de formação que eu lá fiz de sonoplastia, gravação em multipista, por aí fora. Grandes amigos e grandes profissionais. Mas fui visitar, muitas vezes, lá as instalações deles – a Renascença está muito bem; se
RR p7 de 7 aos 5M48S- formos visitar as instalações dizemos “Nunca mais apostaram…” porquê e eu estou à vontade para lhe dizer o seguinte. Porque eu, há dez anos, creio que é há dez anos ou oito, pedi – porque tinha alunos a quem dava a parte de som, de áudio, alunos de vídeo e tinha alunos de fotografia, mas que não eram meus alunos.
RR p7 de 7 aos 6M16S- De vídeo e de som – ao professor de fotografia para arranjar dois alunos para fotografarem, um de vídeo para filmar e um dos meus para captar o som. E fui à TSF – onde eu ministrei, antes da TSF, abri e depois, no primeiro ano, quando aconteceu a desgraça do Chiado, eu estava a dar aulas noutro edifício em frente ao quartel-general… Sete Rios, S.
RR p7 de 7 aos 6M40S- Sebastião, ou coisa assim – não sei se também lá estiveste e, então, o que é que acontece: acontece que, atualmente, a RDP estava a precisar de substituir, reequipar-se, atualizar-se. Eu vou lá menos do que lá ia dantes porque, atualmente, porque… questões que têm a ver com o meu futuro, caso eu morra, o Fundo de Auxílio Póstumo [fundado em 1959 permite que os associados tenham garantida uma verba para o seu próprio funeral], um fundo que
RR p7 de 7 aos 7M12S- nós pagamos. E outras vezes ia lá por causa das visitas de estudo da EPI. Mas, dizia eu, eu fui filmar com o microfone da ETIC, técnicos de fotografia, áudio e imagem HD um DVD que – os brutos também os tenho, dei cópia e direitos de autor, cedi-os à escola -, ou seja, o que é uma rádio digital hoje em dia.
  Parte 1 video sobre TSF
Parte 2 video sobre TSF
RR p7 de 7 aos 7M43S- Que é o caso da TSF, já na Pontinha… não, como é que se chama aquilo ali… FSS: Na Matinha. RR: Na Matinha, perdão. Foi lá que eu fui filmar e ainda fui lá encontrar desde o Fernando Alves mais uma data de amigos que ainda lá estão desde o início.
RR p7 de 7 aos 8M2S- Para dizer que eu sei o que é a Renascença, sei o que é a RDP e sei o que é a TSF. Por dentro. Na prática e tenho documentado. E a mim dói-me porque o boneco está a roubar clarividência, chamemos-lhe assim, clarividência, não deixa as pessoas pensarem aquilo que deviam.
RR p7 de 7 aos 8M27S- E, se a rádio, não for a ter o José Manuel Rosendo e mais dois ou três que sabem fazer rádio, um dia destes aquilo não vale nada. Nem para escola serve. E podia servir para escola. E eu sei que, de hoje a amanhã, passam as emissões em simultâneo para rádio e televisão.
RR p7 de 7 aos 8M50S- FSS: Há dois ou três meses, numa das reuniões da UER [União Europeia de Radiodifusão], apareceu um tipo respeitado: abriu uma comunicação a dizer “A rádio morreu, viva o áudio”. Acompanhas esta ideia? Isto é, o áudio substitui a rádio? Deixa de se ouvir rádio da forma tradicional?
RR p7 de 7 aos 9M9S- Já não se ouvem em transístores, mas… RR: Claro, não me admira que seja assim, não tenho nada contra e a expressão está bem utilizada. Porque uma coisa é o som, outra coisa é o áudio, de facto. E a expressão é feliz porque, de facto, é isso.
RR p7 de 7 aos 9M25S- O manuseamento do som é o áudio, portanto. A rádio acabou ou vai acabar. Eu nada me estranha porque, se repararmos bem, tu hoje em dia podes chegar a casa ou até fora de casa e podes programar as notícias que queres ver em função da facilidade que tens ao gravar, a partir do teu telemóvel, gravares e veres e tudo no telemóvel.
RR p7 de 7 aos 9M58S- Podes editar. A rádio é a mesma coisa. Há um pormenor, eu apaixonado da rádio, acordo e tenho dois rádios à mesinha de cabeceira e adormeço… Depois adormeço primeiro, eles desligam-se automaticamente, acordo de manhã, antes das oito e desligam-se passado uma hora outra vez.
RR p7 de 7 aos 10M19S- Vou para a casa de banho, faço a minha higiene, tenho as luzes do exaustor e o rádio aceso ao mesmo tempo. Vou para a cozinha de rádio. A trabalhar tenho rádio. Se ligar o rádio, na sala, ligo a rádio para escutar.
RR p7 de 7 aos 10M35S- É aquilo a que chamo portabilidade: tu podes levar a rádio para onde quiseres. Acredito, se de hoje a amanhã, como temos aí hoje graças a, ajuda-me… Os sistemas que todos nós utilizamos. Entro no carro e tenho som no meu telemóvel… FSS: Bluetooth? RR: Bluetooth!
RR p7 de 7 aos 11M3S- Ou seja, nós hoje já podemos ter controle da nossa casa, da segurança da nossa casa, o automóvel de hoje para amanhã… O Tesla vai modificar, tudo isso do futuro… A condição automóvel, os sistemas elétricos… Se os sistemas de condução e o controlo à distância nascem, o rádio também. Há uma coisa que, para mim, espero que não desapareça: a presença viva e humana, o
RR p7 de 7 aos 11M33S- respirar, deixar de te ouvir, Sena Santos — deixar de ouvir o José Manuel Rosendo, deixar de ouvir mesmo que seja com algumas asneiras aquelas pessoas que estão ali, que respiram. FS: A humanidade da rádio. FSS: A comunicação humana.
RR p7 de 7 aos 11M48S- RR: Porque há um programa, digo-te. O grande filme da minha vida, e tenho muitos, mas em termos tecnológicos foi – e voltei a ver esta semana que passou – 2001: Odisseia no Espaço. Que eu dou como referência aos meus alunos. Tal que o Kubrick, quando filma, numa entrevista que vinha na Vida Mundial, na altura, “Mas
RR p7 de 7 aos 12M7S- aquilo tem a ver com a luta entre o homem e a máquina?” E ele diz “Não. Eu se vir uma formiga no chão, nem a formiga mato”, respondeu. Mas, por exemplo, o Hall 9000, que é desmemorizado a dada altura, consegue fazer a leitura labial. Quando te fecham dentro de uma cápsula, à distância, conseguem.
RR p7 de 7 aos 12M28S- Sabes quem faz a leitura labial? Sei porque tenho um filho que, a pôr o aparelhozinho no ouvido, descobriu “O botão de acender a luz tem barulho”. Ele nunca tinha ouvido barulhos até usar aparelhos. E, quando vês uma pessoa a olhar-te nos lábios, ela está a ler os teus lábios.
RR p7 de 7 aos 12M49S- Outra coisa: depois é aquela luta pela sobrevivência num poço de água, que há, entre os macacóides que lá estão e se funde a imagem do osso com a cápsula no ar e vê-se ali Wagner. É, é mesmo, Wagner. E depois funde com o Danúbio Azul de Strauss. Aquilo tem tudo e está lá o célebre monólito que acompanha desde o princípio ao fim, então
RR p7 de 7 aos 13M27S- o personagem deitadinho, rugoso, porque a viagem e o tempo o fez envelhecer daquela maneira. Está lá tudo. Quer dizer, a tecnologia e a evolução, aquilo é a década de 70, 80… 60. Ainda não tinha vindo para Angola, salvo erro.
RR p7 de 7 aos 13M46S- FSS: O 2001? É mais tarde? RR: É 1980, é [é de 1968]. As tecnologias digitais são da década de 80. Portanto, isto, a mim dói-me se não tivermos lá esse homem que respira, que me diz “Bom
RR p7 de 7 aos 14M2S- dia, Rui”… Ele, é assim, às vezes parece que estão a falar para mim. Percebes isso que eu quero dizer? Eu também sou um ouvinte da Alexandra Lucas Coelho, também pertenço a essa nova geração, novas lufadas, da maneira de fazer rádio, de ler, de….
RR p7 de 7 aos 14M21S- Parece que ela está a ler um livro e tu, em casa, folheias a página. Mas isto é mesmo. O Fernando Alves tem uma capacidade de improviso única. Tinha o outro colega açoriano que já cá não está infelizmente, também…. Aquilo é um duo.
RR p7 de 7 aos 14M39S- Mas é um duo que é único. Ouvir uma crónica do Fernando Alves, para mim, é ganhar um dia, não é? FSS: Sim. RR: Portanto, à pergunta “A junção da rádio e da televisão…”, o Nicholas Negroponte, dizia nesse livro do Being Digital, o seguinte: que tanta tecnologia temos e tanto dinheiro
RR p7 de 7 aos 15M11S- gastamos, que bom seria – mais ou menos isto se gastássemos mais nos conteúdos e menos na tecnologia. E aqui, se gastássemos mais nas pessoas, e menos nas tecnologias porque, apesar de tudo, ainda temos muito ignorante, iletrado e digitalmente não-operacional no nosso país, não é.
RR p7 de 7 aos 15M37S- Da maneira como eu dei aquela referência, que a minha mãe mandou parar a guerra para eu em 1945 nascer, teria o gosto de convidá-los para almoçar se tivessem tempo.
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