Entrevistado por Paulo Barbosa – Registado por Cláudia Figueiredo em Lisboa 11 Julho de 2017.
influência de pertencer ao partido na RTP * os técnicos não aparecem na ficha técnica.
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P Barbosa— Já dentro da RTP. Portanto, existem alguns relatos, ou alguns mitos, que dizem que a RTP teve sempre grandes influências políticas, quer dos governos, quer dos partidos, a manobrar no fundo o controlo da informação que havia na RTP. A minha pergunta é: se vocês dentro das áreas mais técnicas se também sofreram ou beneficiaram por esses alinhamentos, é, em relação aos partidos políticos, depois do 25 de abril, porque é porque foi depois que o Magriço já lá estava.
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JP Magriço— Bem, eu quando entrei na RTP já toda a efervescência revolucionária, estaria atenuada. Portanto, já em 1979, portanto, no final. Quando entrei, portanto. Quando entrei no exercício das funções do Ministério da Educação foi em 1971, 15 dias depois ter saído da tropa. Portanto, logo de imediato comecei a exercer uma atividade profissional. É isto no IMAVE, numa altura que já foi referenciado, não é. Mas, depois do desempenho na função pública, durante oito anos e tal, é entrei num processo diferente na RTP. Portanto, fiz um curso de formação, que eu já também referi, durante uns meses, porque na altura a formação era dada com todos, compassadamente, e bem estruturada. Agora tudo é muito apressado, com PowerPoints muito rápidos e depois as pessoas nunca mais se apercebem o que que andaram a ver nem a fazer. E entretanto, este processo de entrada na RTP começou por no desempenho das funções de técnico de eletrônica, na altura era o que se designava na carreira profissional, era técnico em eletrónica. E tinha uma carreira que não era muito elevada, na estrutura, portanto era uma carreira que tinha pra aí três ou quatro passos, depois se passava a ser o supervisor de eletrónica, e depois tinha mais um degrau que era responsável técnico, uma designação que su… tinha três passos e que em cada um deles tinha que se manter durante um determinado tempo para evoluir na carreira. Na altura já havia negociações as tabelas salariais eram definidas por escalonamentos, ou seja, havia a possibilidade de o indivíduo manter-se na carreira mas ter sempre uma progressão salarial que ia compensar percentualmente na horizontal e depois tinha degraus, tinha promoções. Portanto, tinham promoções que ao fim de determinado número de anos na sua atividade poderiam ir até ao máximo de responsável técnico. E também como já referi na na situação anterior, a situação dos técnicos em eletrónica quando entrei por negociação de acordo da empresa, e devido ao número de trabalhadores no desempenho operacional em maior número do que os de técnicos em eletrónica, estamos a comparar uma coisa da ordem de 600 técnicos operacionais e 600 técnicos de eletrónica.
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P Barbosa— 600 não.
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JP Magriço— 600 não, cento e quarenta e poucos. portanto, havia aqui uma disparidade nas negociações e houve cedências do sindicato, de maneira que para chegarem a um acordo tivessem criado uma situação desigual da ordem dos 25{eac6b5875ddae926700b2c4e8464bb0ece25601256fda3402f3cffca93cca374} dos salários na entrada e na progressão, portanto, em todas as promoções havia um diferencial dessa ordem. Portanto, quando entrei, a RTP, portanto, já tinha passado por essa fase mais, intensa da atividade revolucionária e já tinha estabilizado e já todos os partidos já tinham passado pelo poder, portanto, já todos eles tinham colocado os seus quadros e naturalmente toda a área técnica teria sofrido também essas variações esses compromissos que havia entre o poder do governo e refletia de certa maneira na estrutura da empresa, as ligações de certa forma que cada um dos diretores, cada um dos pessoas de nível mais elevado, e nomeadamente a administração, portanto, a administração também refletia o grau de influência que a RTP ficou sujeita quando o 25 de abril, como meio de comunicação que era, e de divulgação de ideias, portanto, poderia ficar sujeita ao, como aparelho ideológico de estado, como toda a gente tem que reconhecer, é o meio de comunicação era apetecível a qualquer um dos poderes que iam sendo mudados. Claro que a alternativa, a alternância entre os dois partidos de maior dimensão, refletia-se na no jornalismo, no recrutamento de certa forma de todos as áreas da produção. A produção não foi muito afetada. Posso dizer porque os diretores de realização, produção etc., não sofreram grandes modificações. Incorporaram mais uma linha da ordem ideológica mais de esquerda, possivelmente, com o 25 de abril. Havia os tradicionais realizadores e produtores que, de certa forma, também controlavam ainda, portanto, mas também não fizeram grandes modificações na estrutura da empresa. Na direção técnica, o que se operou, em 25 de novembro houve uma substituição de alguns engenheiros que estavam no topo, portanto, da empresa. Na direção técnica foram substituídos porque tinham assim posições divergentes, de certa forma, da linha política que estava, a consolidar-se na época, portanto, a democracia está aqui, se isto não é o povo, onde é que está o povo, e dizia-se frases deste tipo, que revelavam de certa maneira que a influência tanto do PPD tanto como do PS tinham influência sobre as estruturas. Eu quando entrei para a RTP, portanto em 79, estava numa situação de consolidação destas situações. Já existiam, estavam estabelecidas e era assim. Agora, a partir daí também entraram alguns diretores da informação, que se sabia e dizia que estavam de acordo com o calendário político e a mudança política sofriam mudanças. Portanto, a criação do canal 2, por exemplo, ou da, da… tinha sido localizado tinha se deslocalizado, de certa forma, os indivíduo da área mais de esquerda tinham se concentrado mais nesses cana…, no canal novo, e dando continuidade ao que estava no canal do RTP 1, portanto, esta divisão ao nível da própria informação, repare. E havia duas informações quase distintas, havia uma informação para a esquerda e uma informação para o centro. Não diria de direita, mas havia influências aí notórias. Isto é próprio e se forem analisar alguns dos telejornais da época somos capazes de ver que a notícia tinha pequenas diferenças na avaliação e na interpretação do próprio jornalista e o jornalismo era feito de forma diferenciada. Portanto, esses aspetos eu senti-os também como trabalhador, porque estava em presença, eu sempre trabalhei na área técnica associada não… tanto à produção tudo que se havia da época, programas de, de séries, outros programas que haviam, mas também eu dava um apoio de certa forma da assistência técnica aos períodos em que a informação estava a ser produzida. E a informação tinha vários vários, durante o dia tinha… a uma hora da tarde, por exemplo, às 8, etc e à noite. Haviam de certa forma, e eu acompanhava por horário, acompanhava e assistia tecnicamente esses programas. Tínhamos uma política muito interessante, por exemplo, o meu nome nunca apareceu escrito em nenhum programa. Embora eu tivesse lá como assistência técnica. Não sei reparem nós… Os técnicos sempre, nos colocamos numa posição não de mostrar isto durante muitos anos. Enquanto na área da produção, quando se ia fazer um exterior, por exemplo, os técnicos de eletrónica que estavam associados à produção eram referenciados os seus nomes, mas os que trabalhavam nos estúdios, os que estavam a acompanhar os telejornais e outras que, …os nomes nunca apareciam. Portanto, começamos sendo muito discretos relativamente a essa questão de o nome aparecer nos genéricos da abertura e de fecho dos programas, está bem. Isso foi sempre uma coisa, foi uma linha definida e foi aceite e ninguém andou preocupado com isso. Mas os que estavam mais associados ao vedeta da produção ou aos artistas e aos atores etc., aos elencos diferentes que se produziam, havia normalmente mais… o aspeto técnico era considerado.
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P Barbosa— Mas isso não é um contrassenso? Quer dizer, se vocês até salarialmente tinham mais 25{eac6b5875ddae926700b2c4e8464bb0ece25601256fda3402f3cffca93cca374} de ordenado que um operador de câmara, depois quando, passava um telejornal ou passava o programa da manhã, o inferior no fundo era referenciado como autor do programa e o que está…
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JP Magriço— Pronto, eu acho que não havia muita contradição, acho que havia era uma descrição das pessoas que trabalhavam nesta área. Nunca senti… também é verdade que da informação ou da produção, isto deve ter sido qualquer coisa que se iniciou mas eu não sei bem como, mas não foi uma restrição. Eu não ia exigir, eu não ia exigir uma coisa dessas. Ou os produtores dos programas da área informativa e da área produção normal, é, preocupavam-se em fazer a listagem e ir aos mapas de produção e ver lá quem é que estava na assistência técnica ou na produção, mas isso é … a verdade é que isso era assim. Portanto, e foi uma coisa que foi aceite e creio que quando eu fui para lá já era assim que se operava. Na área da produção propriamente dita, é, para programas tipo séries ou outra qualquer, isso era incluído naturalmente. Na área da informação, que eram os programas diários, que se faziam em diretos etc., a maior parte deles era diretos, nunca houve essa preocupação. Pronto.
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P Barbosa— Já agora só uma nuance. No IMAVE, quando vocês faziam a telescola, na ficha técnica os técnicos também não apareciam?
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JP Magriço— Também já não entravam. Interessante. Quer dizer, entrava um ou outro como responsável de alguma função, mas não havia essa necessidade de estar referenciado com ficha técnica. O que quer dizer que, é, não há dados, ou seja, não há metadados referenciados, agora numa linguagem mais recente, não há metadados das pessoas que intervieram de certa forma durante o período em que se produziu este tipo de programas diários, portanto de grande influência. Também nunca ninguém sentiu necessidade, tanto eu como os meus colegas que estávamos nesse trabalho de acompanhamento de emissão, por exemplo, também não havia. Portanto, no final da emissão também poderia haver alguma referência a quem produziu etc., mas isso também não havia. No conjunto da emissão não. Nos blocos que se inseriam, ou segmentos de programas que se inseriam ao longo de toda uma, uma produção diária, portanto, na emissão diária, não havia essas referências. Pronto, isso é uma coisa que eu quero, não é… ainda bem que isso cá não apareceu, porque senão eu tava agora sujeito a situações mais difíceis a ser chamado à responsabilidade por ter feito algumas coisas.
0:13:24.800
JP Magriço— Porque a câmera não tinha os brancos bem feitos
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JP Magriço— Aconteceram algumas situações engraçadas durante esse período. Pronto, personagens que durante o período da emissão… é evidente que as pessoas que eram referenciadas como acompa…, que acompanhavam a produção do programa, não entrava o nome do chefe. Entrava efetivamente quem estivesse escalado para o desempenho daquela função, está bem. Portanto, se não assim o diretor aparecia sempre, agora há sempre o diretor de informação, o subdiretor e o adjunto do subdiretor, etc., estão lá todos. Pronto, há que caracterizar, de certa maneira, que qual é a estrutura que está no desempenho daquela função. Naquela época não havia essa, esse hábito, essa tradição. E, portanto, foi assim que se operou. Quanto aos aspetos relacionados com a influência política, pode-se dizer, de certa maneira, não vou aqui estar a tentar revelar coisas que não… são inconfessáveis, muitas vezes, mas havia uma influência, algumas linhas de poder, que eu não vou é difícil, é difícil…
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P Barbosa— não está a usar o nome de partido de propósito?
0:14:43.040
JP Magriço— É difícil deixar de não provar. Mas, que sofriam, de certa maneira, as influências da ordem política era verdade. Para além disso, havia depois um conjunto de outras forças que não se manifestavam muito diretamente através dos partidos. Aliás, os partidos são extensões de outras forças que não aparecem normalmente e que são os sistemas organizativos mais de background, diria que alguns são underground, quer dizer que são mais abaixo do, que tinham influência na seleção, portanto, dos diretores, como pessoas que… Nós associávamos. Isto tanto na área da produção, como na área da, como na área da informação, que eram os dois elementos essenciais na constituição da empresa e na parte administrativa da própria empresa, ou seja, a gestão da empresa também era…sabíamos que as pessoas que estariam no desempenho dessas funções, tinham a anuência e a conveniência de alguns, de algumas forças que algumas se representavam por partidos, que eram homens que não se podia dizer que era deste ou daquele partido, mas que na prática eram representantes de algumas forças que não sendo políticas continuavam na gestão. Os administradores não. Isso era notório, que dizer, havia uma ligação mais direta…
0:16:24.060
P Barbosa— Aos partidos.
0:16:24.060
JP Magriço— … aos partidos. Aqueles que estavam mais a cara, não é. E depois havia outros lugares intermédios também que se quiséssemos associar, não é que fosse obrigatório, mas já havia ali também a influência de, por exemplo, vou só citar três, por graça, não vou dizer isto como sendo uma coisa muito complexa, mas poderia dizer-se que havia ali uma loja associada, ou duas lojas, também já nessa época, da maçonaria, havia a Opus Dei, não há dúvidas nenhumas, porque em determinados lugares intermédios onde… porque para além dos lugares topo, havia os lugares intermédios, que eram os lugares que se continuavam por mais tempo. Enquanto que os partidos sucessivamente se andavam a renovar nos quadros e tinha reflexos diretos, fundamentalmente, na informação. Na produção não se sentia grandes variações. A nível do técnico, aí não havia sequer mudança. Ou seja, era… refletia-se menos na área técnica. Isso é o que eu quero dizer que havia maior estabilidade nos lugares de direção técnica do que nas outras chefias intermédias. Quando havia remodelações na estrutura da empresa, sentia-se que alguém ascendia a um determinado lugar e quais eram as forças que estavam envolvidas na…. Às vezes não eram bem decoradas, a pessoa não necessitava dizer eu sou desse partido ou outro. Quer dizer, sentia-se alguns eram associados a partidos, outros eram mesmo sócios dos partidos, ou seja, pagavam as cotas. Portanto, e quando alguém paga uma cota é porque ela tem benefício. Porque senão não entra na organização. Eu acho que isto é claro, não é. Eu nunca estive ligado a nenhum partido, nenhum partido em termos de… ideologicamente senti-me sempre imparcialmente parcial. O que isto quer dizer, quer dizer que eu tomaria posições parciais mas não ficava sujeito em uma história anterior, ou seja, não era um clubista em nenhum aspeto. Não fiquei agarrado a este, agora tem que, como me agarrei a agora tenho que se sujeitar ás situações.
0:18:39.470
P Barbosa— Analisava caso a caso.
0:18:39.470
JP Magriço— Também não era um catavento, que andava a variar de todos os ventos, embora os ventos de predominantes neste país sejam sempre do norte, não é. Mas o que é verdade é que, é, nessa altura a parte técnica era talvez a entidade mais estabilizada em termos das influências externas. E digo porque. Porque era difícil na época encontrar o grau de competência adequado para um desempenho técnico e quando entrou ou quando houve uma tentativa de introduzir a política na direção técnica, houve uma série de disparates sucessivos. Também posso dizer.. também era… eu tava… o desempenho de determinado diretor que vinha sujeito a uma seleção de motivada por ordem política, dava disparate. Porque ele não tinha prepara… poderia ser até engenheiro, mas faltava-lhe o background, o conhecimento a experiência, o know how suficiente para o desempenho correto de uma, de uma direção que não fica sujeita a pressões de ordem política. E muitas vezes sentia-se na direção técnica, no topo da direção técnica, que havia ali tentativas de interferência. Mas também isso sentiu-se sempre, eu também senti isso na direção técnica, que havia não uma rejeição, mas uma atitude firme. E, portanto, quando era necessário fazer a seleção de equipamentos, ou quando havia concursos públicos para, concursos de aquisições, que envolvia a parte económica da empresa, envolvia a parte da direção técnica que está sujeita, a direção técnica sempre teve sujeita a parametrizações de qualidade que não se compadeciam com introdução de técnicas de menor nível que fosse o chamado broadcasting. Portanto, quando havia qualquer coisa a entrar na empresa que não era do grau de qualidade que a direção técnica reconhecia como sendo aquele necessário para o desempenho correto, havia, de certa forma. E havia um escudo, o escudo era o próprio membro da Eurovisão. A RTP como membro da Eurovisão ficava sujeita a uns a um reconhecimento das normas e das recomendações que estavam definidas, e pelas normas que estão… que eram imensas, era uma biblioteca enorme de, pra época, e qualquer projeto que a RTP quisesse envolver, tanto na aquisição de equipamentos, iria ser considerado a parametrização e as especificações técnicas que eram necessárias e, portanto, ali havia uma certa barreira e firmeza necessária para não deixar que os políticos viessem a dizer, este é mais barato, não é só por ser mais barato, é que oferece ou não oferece a qualidade suficiente técnica para o desempenho da função. Portanto, isto é os três níveis. O que sofria efetivamente mais influência podemos dizer que era a informação, porque era aí que se jogava o poder, o xadrez político estava bem definido, e cada vez que havia uma influência por mudança das eleições, o poder alternante dos dois poderes, sentia-se o bascular de certa forma das chefias. Havia uma renovação. Alguns… por isso é que havia muitos diretores de informação, ao longo de toda a história da RTP sempre existiram muitos diretores da informação, todos atingiram o nível de diretor, grande parte deles, e portanto isso são de conhecimento público, e da história da própria RTP, é era quase cada vez que quando havia uma mudança do governo. Havia necessariamente uma substituição. Não era que os outros não tivessem a desempenhar bem, era para mostrar efetivamente que ali havia capacidade de mudar. Portanto, os partidos tinham essa necessidade de mostrar aos seus eleitores, são as pessoas que também não sendo sócios mas querem que a sua empresa política seja aquela que se reflete, que muda e que etc. Na prática depois acabavam por todos a esmorecer, ficam… desmaiavam ao longo do tempo, depois acabavam por concluir de certa forma os mesmos processos, usavam as mesmas técnicas etc.