António Luiz Rafael – Parte 2 de 15

Com António Luiz Rafael. Entrevistado por Júlia Leitão de Barros * Registado por Paulo Barbosa * Évora 27 de Março de 2017

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— E assim esse, e, e,… para quem não sabe, em quê, de que é que constava essa…
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— Ah, as emissoras tinham vários programas que eram feitos por colaboradores e no intervalo desses programas tinha dois a três locutores, da estação, que não era o meu caso, aha..que iam lá fazer locução. E agora vamos transmitir um quarto de hora de música portuguesa, agora vamos ouvir algumas vozes italianas aquilo era muito precário, naquela altura, não havia…
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— Portanto começou por ir, por fazer esse tal programa de Língua Portuguesa, não é?
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— Sim.
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— Era só isso que fazia lá…
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— Fazia a locução, não escrevia o programa.
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— Sim, sim, fazia a locução.
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— Era pago por isso, não?
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— Não, não.
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— Não era, portanto fazia por…
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— Era, era, era por, era por…
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— Que idade é que tinha aí, mais ou menos? Estou só a tentar entrar no…
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— Aí andava perto dos meus 15 anos.
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— Tinha 15 anos.
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— Quinze anos. E nessa altura, nessa altura aos 15 anos, o Rádio Clube Português, na Parede, já eu estava a viver em Lisboa, abriu concurso para locutores e eu concorri.
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— Ah.
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— Eram locutores nessa altura do Rádio Clube Português a famosa Mary, que já morreu; o Jaime Silva Pinto, que ainda veio para Lisboa trabalhar na, no Rádio Clube Português de Lisboa; o José de Nascimento, que já morreu, o Avelar Soeiro, que mais tarde deixou a rádio e passou a trabalhar no Laboratório Nacional de Engenharia Civil, ou coisa que o valha, e abriram um concurso para um locutor. E havia lá um rapaz que mais tarde transitou para os Parodiantes de Lisboa, chamado Mário Meneses dos Santos. Quando eu me apresentei, fui com o meu pai, oh,oh Tão novinho, você quer se meter nessa desgraça desta vida, tão novo. Quer dizer, ele praticamente tava a dizer, é pá, isto não é vida para a sua idade, não é? Mas fiz as provas todas, fiz as provas todas, mas fui reprovado.
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— Mas, mas nessa altura estamos nos anos 40, não é?
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— 40, estamos, estamos, em 47, 48…
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— Pois
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— É uma altura em que a rádio era memo importante, não era?
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— Eu trabalhei pouco na rádio, trabalhei na rádio não chegou a um ano.
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— Pois, pois.
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— Fui, fui para Lourenço Marques.
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— E então vai para Lourenço Marques.
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— Lourenço Marques.. era o meu pai que diz isto não é vida, qual rádio nem qual carapuça. Isso a rádio é para vadios e não sei o quê.
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— Ma nesse tempo havia os preconceitos, contra a gente da rádio, contra a gente do teatro, contra a gente do cinema, tudo isso eram profissões.. aquilo era tudo frequentado por gente muito esquisita.
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— Boémia.
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— …Era uma coisa muito complicada. Bom. Mas o meu pai a certa altura tentou arranjar-me um emprego ainda me arranjou um emprego numa companhia de seguros, mas aquilo não dava, e não sei quê, não sei quê Concluindo [ imperceptível]casas dos meus amigos. Estás a crescer, qualquer dia tens vinte anos, não sei quê, não tens modo de vida. Isto está… o meu pai era um bocado reviralhista, isto politicamente não dá nada, Só, só quem tem, só quem tem, os apoios, e não sei quê … an an. A gente vai, vai regressar a Lourenço Marques.
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— E foi a família toda.
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— Eu conheço aquilo. Ele tinha estado lá 20 anos ou coisa que o valha. Bom, e assim fomos todos para Lourenço Marques. Cheguei a Lourenço Marques e eu ia com a ideia do, da rádio, marcada. O meu pai chegou a Lourenço Marques arranjou-me um emprego. Bom, cheguei a Lourenço Marques e fui estudar, continuar a estudar, mas simultaneamente arranjou-me um part-time num serviço de administração civil, que é uma coisa que hoje já não existe. A administração civil era uma, era uma, um departamento estatal, que, digamos assim, governava as províncias, as províncias todas. Havia, aquilo tinha diversas categorias, tinha chefe de postos, chefes de [imperceptível]. Eram uns pequenos governadores civis colocados nas capitais do distrito.
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— Sim.
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— E depois em Lourenço Marques tinha a sede, onde eu fui para lá como escriturário, que aquilo não me dava gozo nenhum. O Rádio Clube abre concurso. O Rádio Clube, este Rádio Clube.
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— Este Rádio Clube.
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— Este Rádio Clube que está aqui a ver, que começou por se chamar, Clube
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— Grémio, não era?
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— Grémio dos Radiófilos, começou por se chamar Grémio dos Radiófilos. Trabalhava na baixa de Lourenço Marques num quarto alugado e não sei quê, numas instalações precárias. Mas quando cheguei a Lourenço Marques este edifício estava na parte final de construção. Portanto, o Rádio Clube de Moçambique tinha uma coisa que era: atire uma pedra, uma pedra de 20 euros ao rádio, de 20 escudos ao rádio clube. Isso, o atirar, era uma coisa simbólica, era ir lá dar 20 escudos. Pois aquilo foi, foi suportado pelo Estado, foi suportado… Depois criámos um canal em inglês…
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— Mas, espere aí, agora ainda vamos, ainda estamos a entrar.
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— Bom, concluindo, fiz concurso.
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— Portanto…concorreu porque eles estavam a abrir
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— abrir concurso e era para repórter.
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— Era para repórter.
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— Era para repórter.
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— E eu não ganhei o concurso mas fui chamado para repórter mas… Pronto já nessa altura consideravam que eu tinha muito boa voz, coisa que eu não acontece hoje, pois entretanto eu tive uma, uma paralisia na corda vocal esquerda.
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— Mas olhe que ainda tem um timbre bonito.
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— Mas é.
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— Acredito que… a respiração, mas o timbre
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— Eu apanhei um susto desgraçado na altura, foi em dois mil e… 10, 2011, tava convencido que tava com qualquer problema oncológico na garganta. Não tiraram-me logo essas coisas da cabeça.
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— Era a corda esquerda que tinha paralisado. Fiz terapia da fala mas [imperceptível] recuperei parte da corda, não totalmente, mas fiquei sempre com a voz um bocado velada. Mas ainda cheguei a ir fazer rádio aqui em Évora.
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— Sim, mas agora vamos outra vez,
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— Bom. Comecei a fazer as reportagens, acharam que eu tinha muito boa voz, e deram-me algumas horas de estúdio pra fazer, mas
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— Mas, não se lembra nessa altura já havia emiss… esta rádio tinha emissões em português e inglês não era?
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— Não, tinha, tinha emissões em inglês, tinha emissões em português, tinha emissões em.. bom, vamos lá ver, esta rádio no princípio dos princípios só tinha emissões em português, e era x horas por dia. Tanto que quando eu entrei prá, pró Rádio Clube de Moçambique em definitivo o rádio abria às 6 da manhã e fechava à uma.
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— Mas isso é que foi mais tarde?
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— Isso foi mais tarde.
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— Mas depois a seguir à emissão em português, quando houve a transferência para aqui houve praticamente a coincidência de se montar também o serviço em inglês que era a L. M. Radio, Lourenço Marques Radio, que era uma rádio dirigida à África do Sul, tinha um auditório pavoroso conseguia inclusivamente bater em auditório da própria SABC da África do Sul, a South African Broadcasting Corporation as nossas emissões eram popularíssimas, tinham auditório, tinhamos seis ou oito locutores ingleses e não sei o quê. Depois a seguir, criou-se a emissão, a emissão 2, que era… foi quando começou o FM. O FM na rádio começou em Moçambique, não começou aqui em Portugal. Aqui na metrópole na altura. Começámos a transmitir uma emissão em FM
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— a seguir…
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— Aí quê, anos 50?
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— Mais, já..
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— Início dos anos 60?
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— Ainda 58, 59, não posso precisar as datas.
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— Mas temos de ir ainda mais à sua entrada, que eu quero começar
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— Não, estava-lhe a dizer, tava-lhe a dizer…
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— Portanto, foi ao concurso, foi aceite…
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— Fui a concurso, não sei o quê, mas pronto, aquilo era… Mas é que por fim, aí por volta dos anos 52 ou coisa assim abriram um concurso efectivamente para locutores da estação. Eu fiz o concurso e ganhei, fiquei em primeiro lugar. Mas era um concurso a sério, embora seguissem praticamente a tipologia dos concursos da Emissora Nacional. Fazias uma primeira prova de escrita, fazia-se uma prova da redacção sobre um tema que eles deram, que eles davam, e se se passava essa prova, então é que se passava à prova de voz.
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— Ah.
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— Eles davam a prova de voz depois. Havia a velha coisa que era a leitura d’um, d’um noticiário, 3 folhas d’ um noticiário, ah… a suposição que se estava a apresentar um programa que vão ouvir, o que acabaram de ouvir, que é uma coisa que acabou hoje. A senhora abre ou liga um rádio ouve uma música que gosta , quando a música que acabou, se não sabe qual é a música, ninguém lha diz que é A… e depois fazer a prova final, que é o improviso. Mas aí eu já tava um bocado tarimbado por causa da reportagem. Era a mulher do Governador Geral de Moçambique a participar numa festa de Natal com um bodo aos pobres Então explique lá isso pelas suas palavras. Claro se não me mandam calar ainda a esta hora estava a fazer. Foi uma coisa, foi uma coisa, onde eu efetivamente tive muita projeção foi no improviso e já quando entrei aqui na televisão que eu fiz 25 de abris, 10 de junhos e não sei o quê. Pronto. Ganhei o concurso e entrei.

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