Célia Metrass – Parte 2 de 6

Com Célia Metrass em conversa com Mafalda Eiró Gomes. Registado por Cláudia Figueiredo Lisboa, 6 de Julho de 2017

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— Esses cinco ou seis anos que trabalhou antes do 25 de abril… como é que era Lisboa, como é que era as relações com a Comunicação Social, como é que era a censura, como é que se sentia numa empresa…
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—Numa empresa a censura não se sentia. Não era, pelo menos da minha experiência não era… os temas não eram temas políticos e, portanto, a primeira empresa, a Profabril, era do grupo CUF, portanto se alguém se dava bem com o regime era a CUF, portanto, essas questões não se punham. A própria Câmara Municipal de Lisboa, pode ser que daqui a um bocadinho me lembre do nome do presidente da Câmara que não me lembro, e portanto essas questões não se punham muito.
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— Aquilo que existia já nessa altura, que depois piorou, foi o relacionamento completamente subserviente das empresas em relação à Comunicação Social. Portanto a Comunicação Social era o papão que tudo podia, que tudo poderia dizer… omitindo, mentindo, adulterando aquilo que se comunicasse e… todos os desmentidos como se sabe não têm qualquer impacto e portanto isso foi uma coisa desde sempre. Nessa altura muitas coisas eram mediadas. Havia a figura do… havia a figura, e eu julgo que na altura era permitido haver jornalistas contratados pelas empresas como consultores de imprensa. Não eram eles que assinavam as notícias, as notícias saíam do departamento de Relações Públicas, mas havia uma intermediação e uma boa vontade, digamos assim. Porque julgo que elas encaminhariam as a colocação das notícias nisto, hoje em dia é completamente impensável, não é? Agora um jornalista contratado por uma empresa, mas na altura era uma prática comum e que ninguém se incomodava muito. Com… a seguir ao 25 de abril, eu julgo que ficou tudo um bocadinho em pânico, não é, as administrações das empresas ficaram todas um bocadinho em pânico, porque o chão que conheciam foi completamente modificado e, portanto, o poder da da da Comunicação Social passou a ser praticamente um poder absoluto. Portanto uma notícia que saísse poderia ser dramática para para uma empresa. E e não havia sequer grande forma de de contornar isso, na medida em que qualquer tentativa de, especialmente depois do 25 de abril, qualquer tentativa de explicação, ou de clarificação de uma determinada… de um press release ou de uma notícia, corria sérios riscos de ser considerada uma pressão por parte da empresa, portanto ainda era pior, ainda era pior. Eu estive muito pouco tempo nos TLP na Rua Andrade Corvo porque tinha acabado de entrar, tinha passado um mês.
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— Eu entrei no dia 1 de abril de 1974 e, portanto, para aí no dia 1 de maio de 1974 os senhores com quem eu trabalhava saíram todos dentro de um chaimite e eu nunca mais os vi. E na altura, portanto, juntaram os CTT e os TLP e eu fui trabalhar para os serviços centrais, que se chamava Serviço de Informação e Comunicação, e que se passava na rua de São José. E que tinha, não sei se fruto do acaso, se fruto do medo da época, uma coisa que não era frequente e que nós aprendemos que era o ideal que era depender diretamente do Conselho de Administração e do presidente do Conselho de Administração. Portanto, na.. enquanto na Profabril não, dependíamos do diretor de Marketing, nos CTT/TLP, nesse órgão de informação e comunicação conjunto, centralizava em toda a comunicação da empresa, das duas empresas… no fundo estamos a falar de duas empresas, e dependia diretamente do presidente do Conselho de Administração. Portanto, nós vivíamos por cima do do piso onde onde funcionava a Administração, portanto havia realmente uma ligação, uma ligação muito grande. A Comunicação Interna nessa altura desapareceu completamente, ninguém se atrevia, ninguém se atrevia. Portanto, havia a Comunicação Externa na perspetiva das relações com a imprensa, e havia a parte do atendimento ao público.
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— Nessa altura, durante os anos, aqueles primeiros anos, as dificuldades maiores foram fazer passar um conceito, é, mais profissional e de quem vinha e de quem tinha formação na área. Porque havia pessoas a trabalhar soi-disant nas Relações Públicas, que organizavam festas, não é… portanto eram chamadas Relações Públicas do croquete, era um bocadinho isso, era um bocadinho isso. Até produziam algumas publicações, sei lá, quando inauguravam estações dos Correios, as informações ao público eram feitas nas folhas, mas das quais estavam completamente ausentes tudo aquilo que eram os conceitos que nós tínhamos aprendido, não é, no INP, e que defendíamos ferozmente, não é.
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— E portanto não era fácil, porque ainda por cima estamos a falar de serviços centrais que mandavam, e portanto, mandavam teoricamente, pelo menos, todo… e aí começaram a por-se problemas de identidade visual, muito sérios, digamos assim, porque estamos a falar de uma empresa que tinha 40 mil trabalhadores, que estava espalhada pelo país todo, que tinha a componente de Correios e a componente de telecomunicações, com dois mundos e dois e dois ambientes de… até de mentalidade completamente diferentes. Portanto, a parte dos Correios com muito mais soft skills e menos formação académica, digamos assim, a parte das telecomunicações, engenheiros, fundamentalmente engenheiros, e com… um bocadinho com a perspetiva de que o futuro era deles. Realmente o que acontecia é que… por um lado a fusão de duas empresas, portanto as questões de identidade visual punham-se de uma forma muito impactante. E por outro lado a existência também de duas realidades socioeconómicas, digamos assim, e de duas culturas empresariais, mais uma terceira cultura, não esqueci-me, que era que, ainda por cima, tínhamos as telecomunicações da CTT e as telecomunicações que vinham dos TLP, que era uma empresa privada, é, cuja direção eram ingleses.
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—Não é, portanto… a antiga APT era uma empresa inglesa, portanto, tinha uma data de orientações e de mentalidade muito anglo-saxónicas. Portanto todos esses conflitos eram conflitos relativamente complicados de gerir. O dia a dia, para além do serviço de atendimento ao público e para além da gestão e da tentativa de criar uma imagem comum, um estilo de comunicação comum, tinha muito a ver com com o relacionamento com a imprensa, porque era de facto… com a comunicação social, aí muito mais com a imprensa do que com qualquer outra coisa. Ali era muito imprensa, a imprensa tinha realmente um grande peso.

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