Célia Metrass – Parte 1 de 6

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Arquivo Memória Oral das Profissões de Comunicação, Lisboa, 6 de julho de 2017, conversa com Célia Metrass. Operadora de câmera é a Carla Figueiredo e, também, do lado de cá da câmera está Mafalda Eiró Gomes.
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— Dra. Célia Metrass, conheço a sua vida desde 69. Até 69?
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— Bom, até 69 fiz aquilo que as pessoas normais fazem, que é nascem, crescem e vão para a escola. Eu sou de Lisboa, toda a vida vivi em Lisboa, estudei em Lisboa, no Liceu Filipa de Lencastre, e fiz todo o liceu a achar que ia para Medicina. Portanto, fiz a chamada antiga alínea F de Ciências. E quando tinha 19 anos eu resolvi que queria trabalhar porque não queria continuar a viver das semanadas que o meu pai me dava, que eu tinha que lhe pedir, e portanto resolvi que ia começar a responder a anúncios depois de acabar o 7º ano para ir trabalhar, coisa que não era muito bem vista na família. Mas concorri através de um anúncio, e fui contratada para ir trabalhar para a Profabril, para o departamento de Relações Públicas da Profabril. Entretanto, tinha feito uns testes psicotécnicos e uma das coisas que dava era que profissões ligadas à Comunicação, enfim, para além da parte científica, profissões ligadas à Comunicação poderia ser uma uma boa alternativa. E coincidentemente comecei a trabalhar na Profabril e inscrevi-me no INP onde na altura era quase novidade, não era completamente novidade porque já não era o primeiro curso, mas tinham começado a aparecer naquela altura os cursos ligados às Relações Públicas e também ao Turismo, de alguma maneira. E portanto fui para o INP em 1969, e por lá continuei, enfim, depois entretanto acabei por ter que fazer outra vez o 7º ano numa linha de Letras para poder continuar a estudar, mas eu fiz parte do segundo curso de Relações Públicas do INP. Depois, o curso passou a três anos e foi possível as pessoas que tinham feito o curso anteriormente fazer umas cadeiras que faltavam e ficar com o diploma do curso Superior de Relações Públicas e Publicidade, porque o inicial não tinha Publicidade na designação, apesar de nas cadeiras nós termos cadeiras de Publicidade. Portanto o curso tinha, eu diria daquilo que me lembro, qualquer coisa parecida com 20 e tal alunos, era um curso pós-laboral, em que as pessoas trabalhavam praticamente todas. Eu era muito invejada porque era a única que trabalhava na profissão e havia naturalmente um grande entusiasmo em relação à profissão de Relações Públicas e uma grande curiosidade. E julgo que o grupo era um grupo relativamente pequeno mas também porque era pós-laboral, muitas vezes atividades familiares, porque havia gente casada e com filhos e e com empregos mais complicados, e portanto, é, os nossos contactos acabavam por ser circunscritos um bocadinho àquelas horas das aulas, porque fora isso as pessoas tinham outras coisas para fazer. No curso não me lembro de muitos nomes de professores. fui aluna do Américo Ramalho, fui aluna do professor Laginha Serafim, na Estatística, que era uma das nossas dores de cabeça. Tenho ideia que também tivemos aulas com o professor Carlos Amado. E era interessante porque muitas das matérias que nós tínhamos eram já numa perspetiva, diria, evoluída do conceito de Relações Públicas. Portanto, naquela altura havia muita discussão da tradução de Public Relations para Relações Públicas. Havia uma grande contestação, por parte dos alunos e por parte de alguns professores, mas nós tínhamos cadeiras já que iam desde a organização de empresas, da organização nas empresas, até a a parte da escrita, na na produção de comunicados e na produção de de folhas informativas e na na parte da comunicação interna. Aquilo que ia aprendendo tinha algumas oportunidades de aplicar na prática, não muitas. Eu quando entrei para a Profabril entrei como secretária do departamento, tinha 19 anos, não é, portanto de facto também não era previsível fosse, que fosse ter outras grandes responsabilidades. E as Relações Públicas… A empresa era a Profabril, a Profabril era uma grande empresa de engenharia, é, do grupo CUF, portanto fazia projetos de engenharia. Era uma empresa que tinha 300 engenheiros e 40 arquitetos e muito poucas mulheres. Enfim, de facto era uma empresa tradicional para a altura, apesar de que havia um ambiente, digamos, evoluído do ponto de vista do negócio, até porque uma grande parte dos clientes da Profabril faziam projetos em muitos países do mundo. No departamento de Relações Públicas, fundamentalmente havia duas preocupações, que eu julgo que eram habituais para a época nas empresas ou nas instituições onde havia departamento de Relações Públicas, que eram muito poucas. E as duas preocupações eram as relações com a imprensa, não é, portanto os comunicados de imprensa, os press releases, a produção de notícias. No caso da Profabril como havia, ganhavam com muita frequência concursos internacionais, portanto, isso era objeto de notícia para os jornais, era uma coisa que que era prestigiante para a empresa, portanto, que a empresa acarinhava. E a outra que era um chamado, julgo que se chamava boletim informativo, não tenho a certeza, que tinha como… tinha um assessor externo, que era um jornalista. Portanto a a redação final das notícias estava entregue a uma pessoa de fora, portanto, o que nós fazíamos no departamento era uma coisa estranhíssima que era a produção propriamente dita do objeto. E a produção do objeto estamos a falar de uma máquina de escrever que tinha… na altura a máquina que se chamava Radex, que era uma coisa que pintava de branco a letra mal escrita e que a transformava noutra letra. Podia-se escrever por cima. E e isto era muito penoso. Isso lembro-me que era muito penoso porque, é, provavelmente quem era secretária de profissão e tinha aprendido a escrever à máquina como deve ser… eu também tinha aprendido mas não, não era assim tão boa… aquilo ao fim de dois enganos, ou de três enganos ia para o lixo e era preciso começar tudo de novo. Estamos a falar de uma coisa que era escrita já dentro de uma paginação. Portanto, a própria paginação da folha, que tinha umas colunas e uns sítios para as notícias, era toda feita em e era feita desta maneira. Escusado será dizer que esta folha informativa… esta folha informativa eu julgo que tinha, que era mais posterior do que para, do que… não era claramente uma uma folha informativa interna. Aliás, a questão da comunicação interna julgo que… é permanente este problema da comunicação interna é permanente até os nossos dias. Eu aquilo que reconheço como sendo uma linha comum, estamos a falar qualquer coisa como quase 40 anos, estamos a falar de uma vontade de tratar a questão da comunicação interna, mas de uma forma perfeitamente dirigista e de cima para baixo, portanto, quer nessa altura quer ao longo de toda a minha vida, os profissionais das Relações Públicas bem têm pregado diferentemente, mas não conheço nenhum exemplo… a ver se não estou a cometer aqui nenhuma injustiça, mas não conheço nenhum exemplo de comunicação que seja feita nos dois sentidos. Isto é, pode haver um outro meio de comunicação que promova as sugestões, as reclamações internas, com todos os problemas que se sabe que existem e com muitos receios por parte dos trabalhadores de uma determinada instituição em abrirem o coração a aquilo que são as suas reivindicações, aos seus problemas, mas sempre numa… Portanto a necessidade é reconhecida como não há comunicação, nem transversal entre departamentos, nem de cima para baixo, nem de baixo pra cima, e portanto faz-se sempre uma peça, um meio de comunicação que é de cima para baixo. É este, voltando à Profabril, eu julgo que tinha uma componente externa bastante, bastante maior do que… a preocupação era mais de imagem exterior. Estamos a falar de uma situação e de uma prática antes do 25 de abril. Do ponto de vista das mulheres era realmente muito complicado, posso contar uma coisa que tem alguma graça… que é eu fui a primeira mulher na Profabril a ir de calças para o trabalho. Toda gente disse que eu era maluca de ir de calças, nunca ninguém, nenhuma mulher ia de calças, e portanto eu durante os primeiros dias, eu morava muito longe, durante os primeiros dias fui de calças e levei uma saia dentro de um saquinho para o caso de alguém me mandar tirar as calças e ter que voltar a pôr umas saias. Porque isto era possível em uma empresa. Realmente não aconteceu, depois a partir daí as pessoas começaram a andar…
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— E a Profabril era onde?
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— Era na Avenida Infante Santo, a Profabril era na Avenida Infante Santo. E eu morava perto da Avenida da República, portanto, não podia voltar a casa a hora do almoço para mudar de roupa. Depois saí da Profabril numa situação de conflito com um diretor, em que o administrador, o presidente do conselho de administração teve a preocupação e a deferência de me chamar e me explicou que até achava que eu tinha razão, mas que era completamente impossível pôr em causa a figura de um diretor daquele nível e que, portanto, entre os dois, depois daquilo que se tinha passado, um dos dois teria que sair e, portanto, naturalmente que iria ser eu. E a seguir fui trabalhar para um gabinete de Relações Públicas. Mais uma vez cheia de sorte, porque entretanto os meus seis colegas, porque entretanto já tinha acabado o curso, continuavam a fazer as coisas mais variadas ansiando por trabalhar nessas áreas. Esse gabinete de Relações Públicas era uma coisa muito pequenina, eu tinha formação, as outras pessoas que lá estavam tinham, faziam mais a parte de contactos e de angariação de clientes e, portanto, o trabalho mais técnico acabava por ser meu. Trabalhámos para a Câmara Municipal de Lisboa, era um grande cliente, os serviços… na altura a componente de informação ao público nasceu, nessa altura. Julgo que foi o primeiro centro de atendimento de… como é que se chama… das pessoas que vivem na cidade de Lisboa.
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— Cidadão, munícipe?
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— Ao munícipe, exatamente, era ali ao pé dos Restauradores. Portanto montamos, fizemos a formação das pessoas que iam passar a atender o público, e depois comecei a trabalhar nos TLP. Primeiro como consultora e depois fui convidada… fui convidada, aliás, creio que, já não me lembro bem, mas comecei por trabalhar porque pediram ao gabinete uma pessoa part time, ou… e depois me convidaram para ficar em full time e fui trabalhar para os TLP. Apanhei o 25 de abril a trabalhar nos TLP.

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